15 de jan. de 2014

O DESPERTAR PARA OS ALIMENTOS TRADICIONAIS.

Imagem: Aluízzio Vieira


As formas de se alimentar de um núcleo, região ou país, se constitui por necessidade de sobrevivência e também por método de associação e gostos passado de pai para filho, como afirma (CASCUDO, p.32, 2011), quando diz que “comer é um ato orgânico que a inteligência torna social”. Tal abordagem entra em sinergia com a alusão que (ZUIN, p. 23, 2008,) fez ao conceito de mediação de Vygotsky, quando diz que transforma:


A atividade humana é mediada por uma infinidade de elementos das mais diversas naturezas, sejam eles, traços essenciais do ser humano, enquanto ser em desenvolvimento histórico, relações interpessoais, objetos ou instrumentos, necessidades e finalidades, valores e interesses etc. É por meio desses elementos que os homens vão constituindo-se e construindo a cultura.


À luz dessa afirmação, pode-se dizer que nenhum alimento está livre das associações culturais que a sociedade lhe atribui, que os hábitos alimentares estão constituídos de uma norma cultural carregada de símbolos, significados e classificações, podendo assim dizer que tais associações determinam o que se come nos núcleos de convivência.

Diante dos vertentes ciclos de consumo de alimentos da sociedade atual, o processo de massificação na produção de alimentos deixa de ser a única verdade absoluta, e encontra novas resistências através de movimentos, que viabilizam, e apontam para a população novas formas de assimilar os hábitos cotidianos, não só como uma alimentação saudável e com desempenho sociocultural, mas também que dinamize o desenvolvimento de produção local dos produtos primários.


Em oposição aos alimentos industrializados, surgem movimentos antagônicos não só da sociedade consumidora como também da classe produtora, que buscam desenvolver novas formas de agregar valor a um produto cultural já existente para embuti-los de valores monetário, os chamados produtos tradicionais.


Os produtos tradicionais, também são denominados produtos com história, pois se constituem e fazem parte da história social de uma determinada cultura. Vindos de um longo tempo, através de gerações que os foram produzindo e recriando, esses produtos marcam um processo que reúne relações sociais e familiares, num encontro entre o saber e a experiência; portanto, a produção desses alimentos é, ainda, uma arte construída ao longo do tempo através da tradição familiar (ZUIN & ZUIN apud RIBEIRO e MARTINS, 2008, p. 111).


Diante desta prerrogativa, os alimentos tradicionais se constituem, em sua verdadeira essência, a partir das matérias primas da região, dos meios de produção manufatureiras familiares, da hierarquia histórica do saber fazer local, deflagrando um processo arraigado de valores na construção do simbolismo dos consumidores. Para Ribeiro e Martins (1995), os alimentos tradicionais são "um produto único pelo emprego de matérias primas e pelos conhecimentos aplicados, assim como os usos de produção, de consumo e de distribuição e que atualmente recebem, entre outras, as denominações de local, artesanal ou regional.”

Com a globalização, os alimentos massificados ganham prateleira, mas perdem valores, conduzindo os consumidores à busca de novos hábitos e alternativas de alimentar-se, não apenas como fator de necessidade, mas com a consciência da cadeia que envolve o alimento tradicional.


O produto tradicional atrela a si uma relevante importância, como os nutricionais, os orgânicos, os de produção hierárquica cultural. Além das manifestações culturais como as festas de colheita que envolve a comunidade local, tornando os alimentos tradicionais um produto de valores agregados para o consumidor. ZUIN & ZUIN, (2009) afirmam que:


"O alimento tradicional se caracteriza como uma "delícia autêntica", pelo seu modo de preparo e por sua origem cultural e histórica singular. Falar de alimentos tradicionais é contrapor a lógica de produtos massificados, que são produzidos em escalas industriais, não apresentando diferenciações sensoriais por parte do consumidor."


É neste enredo que a concepção de “cultivar cultura” através dos alimentos tradicionais entra em consonância com as novas diretrizes dos consumidores, que já não encontram identidade nas comidas sintéticas, pois buscam uma “delicia autêntica”, que conforte tanto as necessidades primárias como os sentimentos de lembranças.

Identificando essa nova tendência, o incentivo à produção desse tipo de alimento pode estimular e valorizar dia a dia os pequenos produtores locais, que detêm o manejo das técnicas, além da identidade sociocultural arraigada nos produtos locais e regionais, podendo elevá-los a um patamar econômico mais digno. (ZUIN & ZUIN; 2008 p. 114).


A partir de todo esse ciclo de virtudes, surgem os movimentos a favor dos alimentos tradicionais que se mostram em vitrines cibernéticas[2], com o intuito de divulgar essa nova prática de alimentar-se. Esse é o caso do Slow Food, que almeja resgatar as tradições regionais do alimento relacionado ao consumo de qualidade através da matéria prima local, assim ressalta (IRVING, 2008, p. 40), no manual do Slow Food:


O Slow Food está justamente na encruzilhada entre a ética e o prazer, entre a ecologia e a gastronomia. Ele se opõe à padronização do paladar, ao poder irrestrito das multinacionais, à agricultura industrializada e à estupidez da vida agitada. Ele restaura a dignidade cultural do alimento e os ritmos mais lentos da convivência à mesa. É um universo de pessoas que trocam conhecimentos e experiências. Ele acredita que todo prato que comemos deve ser o resultado de escolhas feitas nos campos, a bordo de embarcações, em vinhedos, em escolas e em parlamentos.



Diante do exposto, a paraíba revela-se em passos tímidos em relação à valorização dos alimentos tradicionais, possuindo políticas que não se direcionam a este enredo, ou até, construindo outras bases que não sejam mencionadas como alimentos tradicionais.


O "arroz da terra" ou "arroz vermelho" é um matéria prima tradicional de altíssimo valor no estado da Paraíba, que representa a evolução e as tradições culturais de um povo, podendo ser melhor trabalhado para se tornar um atrativo para os turistas que buscam consumir a cultura da região, porém, esse tema será mais um dos nossos posts futuros, aguardem!

TEXTO: ALUÍZZIO VIEIRA


FONTES:

CASCUDO, Luís câmara. Historia da Alimentação no Brasil. 4ª ed. São Paulo. Global, 2011.

IRVING, John. Bem Vindos ao Nosso Mundo: O Manual Slow Food. Torino: Slow Food. 2008. Disponível em: . Acesso em: 05 out de 2012.

RIBEIRO, M.; MARTINS, C. A tradição já não é o que era dantes: a valorização dos produtos tradicionais face à mudança social. Economia e Sociologia, n.60, p. 29-43, 1995.

ZUIN, L., ZUIN, P.. PRODUÇÃO DE ALIMENTOS TRADICIONAIS Contribuindo para o desenvolvimento local/regional e dos pequenos produtores rurais. Revista Brasileira de Gestão e Desenvolvimento Regional, América do Norte, 4, fev. 2008. Disponível em: . Acesso em: 26 Jan. 2012.

______. Produção de alimentos tradicionais: valorizando o produto pecuário por meio de certificações de indicação de procedência. Revista Colombiana de Ciências Pecuárias v.22 n.3 Medellín jul./set, versão impressa. 2009.

______. Produção de alimentos tradicionais: extensão rural. Aparecida, SP: Editora Idéias e Letras, 2008.

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